23 maio, 2012

Demasiada independência


'Sei, tanto te soltei que você me quis
Em todo lugar, lia em cada olhar
Quanta intenção eu vivia preso...' (Los Herm.)


Que sentasse ao meu lado e me oferecesse uma xícara de chocolate quente, era o que eu queria agora. Compreensão e paciência que viessem acompanhadas. Desejaria que minhas escolhas fossem irrefutáveis, mesmo sabendo que não seria possível, não neste momento, mas eu preciso finalizar uma história que nem começou. Nossas flores tentaram brotar no inverno, mas não sou de misturar estações, então cada coisa no seu lugar. E eu, ultimamente, ando preferindo a chuva. Que devo pensar melhor, rever o que bem pouco passamos e voltar atrás, fico pensando se me dirás coisas desse tipo e faltaria coragem minha pra dizer que sou segura o bastante em minha decisões. Mesmo que nem sempre seja verdade, admito, mas nesta hora haveria de ser. 
Motivos que você me deu, motivos que eu mesma me dei, agora não importa, meus pés há muito tempo caminham em busca de liberdade, já que meu coração está arranhado demais para se entregar. Não vou te pedir pra me entender, sei que sou um tanto incompreensível e isso não me abala mais. E pelo apreço que tenho por ti, só peço que se cuide.
Agora, olhando as cortinas marrons que escondem as janelas do meu quarto, desejei eu mesma, buscar meu chocolate quente, aos invés de me sentir presa em pensamentos e vontades de alguém que pudesse trazer para mim. Essa demasiada independência que insiste em me acompanhar mesmo nas horas vagas. Ela é a culpada de tudo que não deu continuidade entre nós.

20 maio, 2012

O óculos

Bati em sua porta. Coração acelerado, mãos frias, goma de mascar na boca para disfarçar o nervosismo. Horas atrás estive aqui, lágrimas nos olhos, pés se arrastando até a porta, esta mesma que está aqui em minha frente agora.
Você abriu e me adiantei em pedir um copo d'água para que não tivéssemos assunto inicial. Foi inevitável.
- Olha - ele disse - eu sei o quanto está sendo difícil pra nós dois, mas...
Eu o interrompi, não queria ouvir aquelas palavras novamente. Você sabe, nossa longa história haveria de deixar marcas profundas e seria dispensável tocá-las para experimentar a dor. Ela já estava ali, fincada, cravada no peito.
- Esqueci meu óculos. - Disse fria e seca de forma que ele me olhou assustado. Pensou mesmo que eu estaria ali por um outro motivo. Ou pensou que talvez eu implorasse por mais uma chance. Mas não, eu não chegaria aquele ponto.
Varri os olhos pela sala e vi ele lá, o óculos, intacto, sobre a estante de madeira fina. É, eu o havia deixado mesmo ali, no momento que não queria que as lágrimas embaçassem suas preciosas lentes.
O peguei e saí. Sem me despedir, sem olhar pra trás. Sem dizer que, na verdade, era meu coração que eu esquecera ali, em sua casa, em sua sala, em suas mãos. Um dia quem sabe eu voltarei para buscá-lo também.


10 maio, 2012

Aquela menina


Ficava assim, perdida no tempo, estalando os dedos e cantando uma música lenta, tão lenta que quase não parecia que era mesmo uma música, mas um verso qualquer decorado de algum daqueles livrinhos de poemas simples que a gente encontra facilmente em bancas de jornais. O sol brilhava lá fora e as árvores pareciam ter mais frutos, mais vida. As flores do jardim em frente coloriam a paisagem e os olhos de quem passava por ali. No aquário, aquele que enfeitava a mesinha de centro, os peixes nadavam e dançavam e até pareciam sorrir uns para os outros. O vento era brisa e até parecia carregado de um aroma cítrico-oriental. Tudo, de alguma forma, tinha cor, luz, vida. A única coisa opaca dali era ela, a menina. E não fazia questão de nada, vivia pra si mesma, levava os dias monotonamente e disso se contentava. De vez em quando recebia visitas, estranhas também como ela, e não muito rápidas. Suponho que ela não gostasse de conversar, ou não tivesse muito assunto, qualquer um dos dois seria convincente. Era quase sempre dispersa, com ar de cansaço, um cansaço antigo, decifrável apenas para ela mesma. Ainda podia observá-la daqui, da brecha da janela do meu quarto, a facilidade que ela tinha de ler e se movimentar num ritmo quase acelerado naquela cadeira de balanço do terraço e me perguntava como ela conseguia ler daquela forma. Mas desisti de tentar entendê-la, ela muitas vezes, parecia sem sentido e eu não ia perder meu tempo, não com ela, não tentando decifrá-la. 
Hoje acordei com uma música vinda de lá, não era tão lenta quanto as que ela cantava. Parei para ouvir melhor, era 'If Today Was Your Last Day', de Nickelback e me surpreendi em notar que nós tínhamos alguma coisa em comum. A afeição por essa música. Tanta afeição que ela a repetia sempre que terminava e eu não me cansava de ouvir. Por dentro da música eu ia me encontrando, me perdendo, me encontrando novamente e creio que ela também. Que havia sentido naquelas notas pra mim, isso eu sabia, mas presumo que, para ela, era muito mais que um sentido qualquer, era algo que fugia da realidade e ao mesmo tempo uma reflexão para a vida. Se hoje fosse o seu último dia, e ela tivesse o poder de mudar sua própria história, seu destino, suas escolhas, quem sabe se tornaria mais brilhante, mais feliz. E eu concordaria, sem querer admitir, que no fundo, no fundo, eu me pareço muito com ela. 

04 maio, 2012

Insegurança


" Seria tão bom se pudéssemos nos relacionar sem que nenhum dos dois esperasse absolutamente nada, mas infelizmente nós, a gente, as pessoas, têm, temos - emoções." 

(Caio F.)

Não, eu ainda não estou apaixonada, embora eu tenha todos os motivos do mundo para estar, ou melhor, embora você esteja me dando todos esses motivos. Mas você sabe que faço o tipo menina-séria-durona-complicada que bate de frente com qualquer possibilidade de apego. Essa minha inabilidade com sentimentos não me permite ir além do que deveria. Do que me espera.
Tenho constantemente a impressão de que, inclusive, estou indo longe demais, e, por vezes, te deixo guiar meus passos. Mas só até um certo ponto, porque passar do limite definitivamente não caberia a nós. Pelo menos não ainda. E se não for pedir muito, tenha paciência comigo. Não sou muito fácil e também não estou com pressa.
Perdoe a minha precariedade de disposição afetiva, é que ainda não estou segura o bastante para acreditar que o amor possa estar batendo em minha porta. Mais uma vez.